Ando para publicar um post sobre isto desde os primeiros dias de trabalho aqui.
Ouvi ou li em Portugal uma frase que na altura me pareceu engraçada mas algo exagerada. "Os escravos em Portugal têm outro nome. São trabalhadores."
Eu sei que fui um privilegiado aí. E sou um privilegiado aqui. Quer pela minha área de trabalho quer pelas condições de trabalho em todos os sítios por onde passei.
Mas nada do que me proporcionaram em Portugal é sequer comparável ao que tenho aqui.
Quem me conhece sabe que não são os bens materiais que me movem. Nunca foram. Nem aí, nem aqui. Devo ser um idealista, só me interessam os mind games, a superação pessoal e profissional, as hacks.
E apesar de ter procurado trabalhar sempre em projectos apaixonantes, desafiadores. Nunca fui tão reconhecido, apoiado, incentivado como aqui. A todos os níveis.
Na Ideawise além do meu salário ser bem mais elevado, e o custo de vida aqui ser bem mais baixo, toda a comida e bebida é gratuita nesta empresa. Quer seja na empresa, quer seja num restaurante ou café qualquer. Desde o pequeno-almoço até ao jantar se quisermos, passando por cafés, leite, chocolate quente, whatever. Não é o preço das coisas que está em questão, uma refeição é muito barata na China para os nossos salários. Mas é o gesto. E a intenção. Aqui temos todos a sensação real que somos mesmo uma equipa. Que dependemos uns dos outros.
Não estou a cuspir no prato em que comi, mas na minha anterior empresa em Portugal até a água os trabalhadores tinham de pagar.
Poderá ser um pouco exagerado mas aqui somos uma família. Somos uma equipa de mais de 30 pessoas. Chineses são uns 5, o resto somos pessoas dos quatro cantos do mundo. Pessoas da Alemanha, da França, da Rússia, de Portugal, dos Camarões, dos Estados Unidos, da Índia, do Burundi, da Suécia e da Inglaterra. E por isso somos uma família. Todos estamos num país diferente, muito diferente, todos deixamos alguém, todos nos compreendemos e percebemos, todos contamos mesmo uns com os outros, todos damos o nosso melhor. Não há, nem pode haver, lugar a mesquinhez. Todos nos ajudamos pessoal e profissionalmente.
Mas voltando à frase inicial, a afirmação não é assim tão descabida. Podemos não estar a falar de escravos de trabalho forçado, escravos negros levados de África para um qualquer país europeu ou americano obrigados a trabalhar de sol a sol recebendo em troca um prato de sopa. Mas o princípio da exploração é o mesmo quando estamos a falar de trabalho pouco ou nada reconhecido e recompensado, chulismo, trabalho sem direitos, às vezes humilhante, tudo para receber qualquer coisa no final do mês (quando é) que dá para pagar a prestação do apartamento minúsculo e a alimentação.
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É mesmo isto, agora, estes momentos que estou a passar, que procurei sempre. E quero que durem para sempre.
Se tivesse a minha gente ao meu lado, era o zénite.
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